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as montanhas me disseram: silencie.
Colares, Portugal
2017




Quando eu trintei, por quatro dias caminhei.
Entre nuvens e pedras, as montanhas foram refúgio.
Havia a urgência de me ver viver. sendo apenas. sendo. apenas. só.
Naqueles tempos, naqueles dias, lutava pra manter a coragem de despir-se, desapegar-se. de toda uma história.
Toda uma história de não ser, não deixar, não se entregar. O início. de um caminho por apenas ser. sem apego.
Eu e meus pensamentos/sentimentos, desajeitados. Acabava de me jogar no vazio. Desfazia de tudo que era estável. Tudo o que era raíz e seguro, em mim. Precisava deixar ir pra que eu pudesse ir.
Aprendia a andar. Não, andar, ainda, não. Engatinhava, rastejava.
No início de um caminho para ver a mim, de perto, só. Aqueles quatro dias tinham sabor de fuga e sal. Chorei, andei, chorei, embolava-me em uma autocobrança de ter que entender. quando só precisava sentir, acolher a mim. Precisava daquilo. Entregar. Só isso. Deixar. Era um passo. Então, escutei a natureza.

No vale, as montanhas me disseram: ouça o silêncio. ele é importante. silencie. silencia todas as vozes na tua cabeça. isto vai ser importante.

Deitei nas pedras e a maré me disse: lembra que tu é parte de mim. Sente no meu movimento que és como tudo desta terra, fluxo, onda, altos e baixos. Pare sempre pra ouvir sua maré interna. Tenha consciência de seu momento. Pelo silêncio, conseguirá perceber o que diz teu coração. Tome o seu tempo, mas siga o fluir da sua maré, intua.
E do alto, olhei pro horizonte. Futuro. Imenso. Um céu, um oceano.

O horizonte me disse: do que está além do agora, nada podes saber. Saiba que não sabes de nada. Só fluirá pela vida através da gratidão pelo que lhe for ofertado. Agora. Agora, é esta visão que tens. Não posso dizer-te mais nada, o seu horizonte está no agora, em toda oportunidade que puderes ver, agora. Eu sou esta linha. A que divide o antes e o agora.
Olhei pro céu, invariavelmente, lembro de Brasília. Oceano, pra mim, Portugal.

No meio, a linha, do horizonte-agora. E eu ali.
Agradeci. Ao passado e ao agora. Ao movimento de cada passo, que vai construindo o que virá a ser. Agradeço tudo e todas pessoas no caminho. Tudo me ajuda. Todo acontecimento. Todo erro, toda queda, todo passo certeiro. Tudo me ajuda a aprender a caminhar e a não ver a mim mesma como expectadora, de fora. A ver-me de dentro. Autora da própria vida, sabendo da minha pequeneza perto da imensidão do universo. Aprendo a fluir e agir. Com a coragem do agora.

Muitas vezes esqueço-me dos conselhos daqueles quatro dias. Então olho de novo pra estas fotos, e pra este texto. Escolho partilhar. Tudo isso não é sobre mim. É sobre todos. É sobre o que aprendi, e o que se aprende é pra se partilhar.
Então, caminho até aqui, com todos que ficaram em mim, ontem, hoje, a cada dia. A cada queda, aprendo a me levantar, caminhar. Aprendo que tudo é questão, de apenas, amar.

Conversas com a natureza, agosto, 2017.